quarta-feira, março 28, 2007

Sobre Ali Cherri
Imagem: Videobrasil

Un Cercle Autour du Soleil (15’23”, 2005) foi o primeiro vídeo que Ali Cherri realizou na vida. Difícil acreditar, diante da beleza das imagens e da contundência do discurso que elas trazem. O artista invoca memórias marcadas por uma guerra sem vencedores: o prédio cravado de balas, o medo tornado cotidiano. Ali Cherri se questiona se conseguiria viver sem a presença da guerra. Mas a batalha temporariamente findada permite que o seu corpo escondido, mas que não deixa de se reinventar e fabular, retorne à cidade.

Em Untitled (3’15”, 2006) , a sensação de continuidade nós é dada apenas pelo som. A imagem truncada, captada por uma câmera fotográfica, nos mostra uma paisagem com alguns navios partindo do país (que já sabemos de antemão serem navios dos EUA e da França). Mas, se o som é o responsável pela narrativa, pouco ou nada conseguimos captar do que é dito. A tradução só nos é dada no final do video: se tratava de uma mensagem do Estado de Israel, impondo todo a sua máquina de guerra para subjugar a população libanesa. Com recursos simples, Ali nos dá uma dimensão do que aconteceu no Líbano em meados de 2006.


Algumas falas de Ali Cherri

Sobre as imagens
“Eu prefiro manipular imagens a mostrá-las como em um documentário. Eu sou designer gráfico, eu trabalho criando imagens.”

Sobre a realização de Untitled
“Eu usei o celular e câmera fotográfica porque eram os recursos que eu tinha disponíveis, estava preso dentro de casa e não podia sair para pegar uma câmera. Não havia nenhum objetivo estético ou político a priori, foram apenas os meios que eu tinha para registrar aquele momento”.

Sobre a relação com a censura
“É preciso mostrar os vídeos para a polícia, mas eu nunca mostro. Deixo isso sempre para o produtor ou curador dos eventos onde exibo os meus filmes. Ás vezes, a polícia chega durante a exibição para ver que está sendo mostrado. Mas eles são bem educados, convidam a gente para tomar um café e debater o que deve ser mudado ou não no trabalho para não criar problemas. Mas não existe nenhum tipo de coerção nos trabalhos que são exibidos no exterior. O governo fica bem orgulhoso até quando algum libanês é premiado em algum festival internacional. O que existe hoje é a necessidade de se pedir autorização para se fazer uma filmagem pelas ruas do Líbano. Para eu filmar algum prédio, algum monumento, é preciso autorização”.

Al-Shrit Bikhayr - All is well on the border (45’, 1997) de Akram Zaatari

Imagem: Videobrasil

Intencionalmente, ou não, Akram Zaatari brinca com diversas imagens que, por ocuparem em demasia a mídia, ocupam também o nosso imaginário: a criança libanesa fala em tom imponente palavras de ordem, com um que de fanatismo religioso. Mas a imagem, que nos é confortável exatamente por possuir várias nuances assustadoras, deixa fugir algo que entrega o seu caráter de artefato: por um átimo de segundo, um sorriso escapa pela boca da criança, demonstrando toda a sua inocência e desconhecimento do texto que fala. Agora, o desconforto aparece sob outra forma. Como assim pode haver inocência nesse meio corrompido pela guerra? Como essas pessoas, que de tantas vezes se tornarem vítimas, cantam a vingança futura podem, simplesmente, querer tocar a vida?

Podemos citar, ainda, o nosso desconforto ao descobrir que toda a descrição da fuga feita em seus mínimos detalhes por um dos entrevistados, e até então testemunha dos fatos ocorridos, não passa de uma encenação. Só não sabemos se é uma encenação de algo criado por Zaatari ou de algo que realmente aconteceu.

O Líbano pintado no pós-Guerra Civil (ou seria pré-Guerra contra Israel?) por Zaatari foge ao entendimento fácil. Em nenhum momento é possível saber se o que é contado é verdade ou não. O que fica é a pura força da fabulação: o momento em que as personagens se propõem a serem outras, a misturar suas memórias com as memórias do artista, quando atuam para a câmera de Zaatari, “fingindo” ser elas mesmas. Quando um dos personagens encena para a câmera, ele deixa alguns vestígios para que possamos entendê-lo. Para o espectador, resta não se deixar levar por aquilo que se entrega facilmente na tela.

Pequeno registro a respeito de “Several Inadequate Things To Say And Do, March 19, 2004” (17’35”, 2004) de Jeremiah Day e Nesrine Khodr

Imagem: Videobrasil

Uma performance ou a encenação de uma performance? Documentário ou ficção pura e simples (como se essa oposição fosse possível.)? A gravação tem a aparência de um registro doméstico. Mas, alguns efeitos sutis começam a aparecer: a tela se congela por alguns segundos, a velocidade é aumentada, o som é cortado. E daquilo que é proposto, a explicação da situação do Oriente Médio, pouco conseguimos apreender: aquilo que o lettering anuncia, simplesmente não é cumprido pelos “professores” Nesrine e Jeremiah. O trabalho lembra bastante aqueles do chamado “primeiro vídeo”, onde o registro de performances dava o tom.